domingo, 8 de maio de 2067

Calmaria

No âmago da calmaria,
depois de noites ao luar,
nasce o sol em cada dia
porque gosta de cá estar...

I
Alentejo, belo e quente;
Doce, seco e veraniço...
É um poema castiço,
mãe e pai desta semente...
Passa a vida calmamente:
crosta imensa, tão vazia...
O reflorir da pradaria,
que por si se manifesta;
o silêncio em cada sesta,
no âmago da calmaria...

II
Acalmada na lenteza,
no piar de um trigueirão:
chafariz de inspiração,
que nos vem da natureza...
O retumbar da incerteza,
pelos campos a dançar...
O ribeiro a germinar,
leva rumo a tal descanso...
O esvoaço do picanço,
depois de noites ao luar...

III
Cheiro a ermo de ventura,
e de orgulho sempre vivo...
Como o grande adjectivo,
que te rega a formosura...
O que mostras, na figura,
é o espelho da maresia:
um aprazer com simpatia,
que se esvai na escuridão...
e depois da mansidão,
nasce o sol em cada dia...

IV
Bem vestido à sua imagem:
caprichoso e asseado;
como mundo ajardinado,
enfeitando esta mensagem...
Manda gritos de coragem,
para o céu e para o ar...
Como um puto a saltitar,
tem o sol por seu vizinho,
Que se vai bem de mansinho,
porque gosta de cá estar...

(1998)

António Prates - In Sesta Grande