domingo, 8 de maio de 2067

Farras Míticas

MOTE

Na adega do Tonhão,
anda tudo farto e contente,
há bom vinho, aguardente
a palpitar do garrafão;
deuses convivem em união,
com pitéus e harmonia;
brota a branca poesia,
nas árias improvisadas...
E pelas talhas atestadas
tudo impera em alegria...

I
Nestas castas convivências
dá-se o brilho bronzeado,
entre saias, rumba e fado
trovam-se estas apetências...
São diversas indulgências
a mandado do coração,
mais um copo, uma canção
sempre altiva e divertida,
- e assim se goza a vida,
na adega do Tonhão…

II
As olivas da conserva
misturadas com temperos,
e talhadas de alguns peros
ofertadas por Minerva;
há bom vinho de reserva,
que se sorve e se consente...
O gabar de toda a gente,
- num trinar sempre castiço -
com bom queijo, bom chouriço,
anda o mundo farto e contente...

III
Após as dentadas míticas,
nos petiscos que aparecem,
como deuses que agradecem
o primor das Santas críticas...
Nestas farras analíticas,
Prometeu é deus e crente,
porque não fica indiferente
aos conselhos de Japeto,
prevendo que no palheto
há bom vinho e aguardente...

IV
Mais um copo rebrindado
pelas honras de Hefesto:
arde como um manifesto
muito limpo e açucarado;
é condão todo encorpado,
nos cantares de pé p´rá mão:
- um saber que é comunhão
no lugar franco e Elísio,
como as artes de Dionísio
a palpitar do garrafão...

V
Outro copo, mais uns migos,
convidando um outro deus,
o supremo e grande Zeus
entra em paz com os amigos;
venham outros mais antigos,
ou de outra geração…
Poseidon traz o trovão,
que achou por entre-mares,
e com rimas e cantares
deuses convivem em união...

VI
Cantam Ninfas, cantam Graças
todo o bom e o bonito,
convidando Hermafrodito
a encher de novo as taças;
há castanhas e há passas,
muitos risos e magia...
Entre a grande cantoria
tudo é sol e primavera,
onde encanta a boa Hera
com pitéus e harmonia...

VII
Farinheira, vinho e bolos
para Héstia, - mãe da Terra;
até Ares esquece a guerra,
nos poemas com Apolo:
o seu garbo é um consolo,
todo ele é simpatia,
como sábio que nos guia
no guião deste apetite...
E a beleza de Afrodite
brota a branca poesia...

VIII
E Demeter está feliz
pelas talhas brancas-lusas,
bebe a meias com as Musas,
e com a bela Artemis.
- Tudo o que este nume diz
pede mais umas rodadas,
e então as lindas Fadas,
sem manias ou critérios,
improvisam seus mistérios,
nas árias improvisadas...

IX
Psique trinca a divindade;
Eirene sorri ao mundo;
Cronos parte moribundo,
(sem entrar na sociedade);
Hélios pede alacridade
pelas mesas engraçadas...
Com risotas avultadas,
Zefiro ri do poente,
outros riem no consciente,
e pelas talhas atestadas...

X
Entra Atena, emocionada,
como luz de um labirinto;
diz que vai beber do tinto
e fica até de madrugada...
Manda a deusa venerada,
tão divina e tão sadia…
A singular sabedoria
fala alto mundo afora...
E nestes filhos de Pandora
tudo impera em alegria...

(2007)

António Prates – In Sesta Grande