domingo, 8 de maio de 2067

Sonhos de Abril

Chora Abril retalhado,
na doutrina do poder,
seguindo rumo ao passado,
com a liberdade a sofrer...

I
No florescer da pastagem,
perante um lençol mimoso,
avança Alentejo vaidoso,
respira desprezo e coragem...
Dá-nos ar da sua imagem,
num sorriso retratado;
disfarça o ser magoado
que sua alma entristece,
enquanto o povo padece
chora Abril retalhado...

II
Lágrimas já repassadas,
penando no leito do rio;
sente um enorme vazio
sofrido em tantas chuvadas...
Brechas, enfim reparadas,
coisas que dizem fazer…
Passa na água - a correr -
tal percurso viciado,
acena em caldo entornado,
na doutrina do Poder...

III
Lições de memória pequena
que a consciência ditou:
Nobre, o poeta trovou:
“Grândola vila morena...”
Aperta saudade amena,
num coração já cansado...
Sangra sozinho no prado,
enferrujando o celeiro,
verga perante o dinheiro,
seguindo rumo ao passado...

IV
Veste em ar de graça
a sensação que promete,
lavrada no Jet-set,
semeada na lei da caça...
Pobre é gente de raça,
povo que sabe perder,
o teu contento é viver
na ambição do sustento,
esquecido no Mandamento,
com a liberdade a sofrer...

(1999)

António Prates - In Sesta Grande